2005/06/06

Letras

Imaginava-os a escreverem poemas de amor. Fá-lo-iam num diálogo inflamado, de sentidos inebriados por vocábulos incendiários. Poderiam até musicá-los, desde que encontrassem o apoio necessário, afinal muitos dos mais belos poemas de amor nasceram da música.

Não que precisasse dele para os escrever, estava muito para além disso, nascera para as letras, só não teria ainda dado o passo em frente, mas certamente não estava longe. As palavras brotavam-lhe incessantemente, imparáveis, qual manancial cheio pelas chuvas de Abril e subitamente aberto ao exterior. Atropelavam-se, confundiam-se até numa Babel ansiosa por atingir os dedos, parcos para tanta fluência.

Ele servia apenas para lhe fornecer a pressão necessária ao escape dos escritos. Tinha um dom particular de lhe alcançar uma ou duas cordas, daquelas que escondia cuidadosamente e reservava aos momentos em que se permitia subir ao seu Olimpo, onde pairava serenamente sobre todos os outros e se sentia finalmente nela própria.

Também era possuidora de um dom similar relativamente a ele. E era no uso dessa faculdade que o levava a superar-se, a atingir níveis onde nunca antes chegara, por vezes a conseguir que a sua escrita traduzisse sentimentos de uma intensidade capaz de poder figurar na ante-câmara da porta que o separava dos eleitos.

Pensava nisto, enquanto tinha cada vez mais a certeza de que só um deles passaria por essa porta.

1 Comments:

At 12:02 da manhã, Blogger (in)confessada said...

e k seria de nós sem as "letras"?
bjo confesso...

 

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