2009/06/22

Mais notícias do desterro

Parece que a paciência está a compensar. Na quinta-feira passada cheguei aos 4 km, forçando um pouco a perna esquerda mas determinado em parar ao primeiro sinal de dor. Não chegou a doer, embora tivesse ficado a sentir algum desconforto. O anti-inflamatório do fim-de-semana resultou e hoje só parei nos 4,5 km e por cansaço da perna direita. Da esquerda nem sinal de fraqueza.

Ao jantar nova constatação da realidade gastronómica deste grande burgo: come-se habitualmente mal e muito caro. As tiras de choco pareciam pedaços de queijo de tasca da aldeia e eram duras como suspeito sejam as armações dos bovinos, as batatas de saco industrial estavam carregadas de sal. Para compensar pedi cheesecake de sobremesa, que costuma ser aceitável por estas paragens. Entretanto senta-se um rapaz bem cheiroso na mesa ao lado, precisamente do lado de onde vinha o vento. A propósito, lá se foi o mito da terra mais quente onde todas as noites de Verão são para jantar na esplanada. Voltando ao vizinho, o aroma era doce demais para não ser enjoativo, de tal forma que não sei se foi esse ou o do cigarro que, entretanto, retirou da cigarreira e acendeu, que mais contribuiu para que tragasse a sobremesa quase sem respirar, constatando com satisfação, ao menos essa, que o pulmão da piscina ainda cá está. Mais dois pormenores relativos à personagem do lado, a bolsa à tira-colo e a fita para pendurar ao pescoço no telemóvel. Cada um é como se sente bem mas confesso que ainda terei muito caminho a percorrer caso venha a sentir na pele este tipo de bem-estar.

Por último um pensamento do fim-de-semana. Ainda não perdi a esperança de dar uma volta ao país de bicicleta, levando comigo a bagagem necessária. Não são assim tão poucos aqueles que assim passam à porta de casa.

2009/06/18

Mulheres do sul

Tenho-as observado à distância. Por várias razões, nada tenho feito para delas me aproximar, assim como nada faço para me afastar. As impressões que tenho retirado são as seguintes:

  • São mais extrovertidas do que as do norte, na generalidade e sem que a diferença seja muito marcada;
  • Paradoxalmente, são também mais distantes, é mais fácil entabular uma conversação, mas é mais difícil sentir conforto na conversação; aqui a relação com os homens é igual, pormenor curioso é a maior facilidade no tratamento na segunda pessoa mas o maior cuidado na marcação dos territórios;
  • Cuidam mais da apresentação, sobretudo na forma de vestir; aqui também haverá razões para tal, desde logo a maior incidência de sedes de empresas privadas e, sobretudo, de organismos públicos e o consequente aumento das retribuições;
  • Associada a esta última aparece o maior cuidado com a forma física, sem preconceitos quanto à indumentária desportiva por parte das senhoras menos jovens; aliás é frequente vê-las sozinhas, situação muito rara onde vivo;
  • Parecem-me, baseado em conversas gerais e não em estudo apurado individualizado, menos agarradas a tradições, das quais se destaca a instituição do casamento; mas neste aspecto até tenho a situação de que os homens são os maiores responsáveis por esta situação;
  • Relativamente ao que estava habituado, fico de vez em quando impressionado por algumas manifestações de beleza de origem intercontinental.
No entanto, e como hoje não estou com espírito especialmente provocador, resta acrescentar que a distinção se faz da mesma forma em todo o lado: umas são bem formadas, outras nem por isso.

2009/06/17

Notícias do desterro

Estou há alguns meses desterrado, durante os dias de trabalho. Sinto-me como o Sting na canção, um extra-terrestre legalizado, em tradução de paupérrima qualidade. Estou na capital.

Este tempo de saber de experiência feito, por convívio directo com o modo de vida de outra metrópole, permite-me falar de algumas diferenças. Espero fazê-lo durante os tempos mais próximos, assim tenha inspiração.

Uma das descobertas que fiz foi o passeio marítimo em Oeiras, onde ontem andei a fazer que corria. Na realidade consegui correr durante a longa distância de 3200 metros, contados a partir das marcas separadas por cem metros que lá estão no chão e que acho muito úteis. Impressiona a quantidade de gente que lá anda ao final de uma tarde de terça-feira, não deixando de ser verdade que os 28ºC de temperatura a tanto ajudam. Mas essa parece-me uma diferença evidente para o Norte do país, as pessoas por aqui são muito mais dadas à actividade física e ao lazer. O passeio, em si, é bonito, junto ao mar, muito embora não se compare em extensão ao de Matosinhos, ainda não terminado, ou ao campeão de 15 km de Vila Nova de Gaia. Mas a verdade é que fiquei cliente e tenho-o frequentado com intensidade crescente. O objectivo próximo é correr 5000 metros, o que não tem sido possível devido a uma lesão incomodativa na perna esquerda. É o que dá querer contrariar a PDI e pretender passar para a corrida em poucas semanas a intensidade de três anos de natação.

2009/05/29

Ainda há gente com sorte

Estou temporariamente deslocado do meu local habitual de trabalho. É uma situação comum a muita gente, por sorte nunca me tinha contecido. Fui colocado numa empresa muito maior do que aquela a que pertenço, num espaço aberto, separado com biombos. Por azar, estou encostado à ilha onde moram três senhoras, que prestam apoio de secretariado a vários sectores.


Uma das senhoras, precisamente aquela que está mais próxima do meu posto de trabalho, tem o estranho hábito de agarrar no telefone e rodar todas as pessoas de família e amigos durante o dia. Raramente dou conta de falar de assuntos de trabalho. As chamadas são intermináveis, a senhora fala continuamente, nem sei que tipo de respostas recebe do outro lado da linha ou até se as recebe, já sei o passado clínico completo da sua idosa mãe, pormenores da infãncia da senhora e do irmão, enfim, quando o ambiente do meu outro lado está mais silencioso até me vejo forçado a ir dar uma volta pelas instalações, tal a incapacidade de concentração que a conversa do lado me provoca.


Durante bastante tempo aquele posto esteve vazio. Parece que a senhora foi sujeita a uma intervenção cirúrgica. Foi um sossego.


Acredito que, em tempos de crise, haja muitos postos de trabalho de gente competente que acabem, por razões de mudança de produtos, por exemplo, por ser suprimidos. Mas não posso deixar de concordar que seja a justificação para a resolução de certo tipo de problemas que as próprias pessoas provocam, por acomodação, inércia ou outra qualquer razão que depende só de si.


Para outras pessoas, que tiveram a felicidade de se ver integradas em empresas sólidas e talvez com uma gestão administrativa mais distante, é tempo de sorte, quantas vezes sem que de tal se apercebam.

2009/04/21

Por terras da raia.

Saiu do comboio e olhou para o relógio. Pouco passava das nove da manhã. Tinha saído de Paris na tarde anterior e passara a noite no caminho para Hendaye, pouco tinha dormido, nunca conseguia adormecer profundamente numa cadeira, por mais confortável que fosse. O próximo comboio, aquele que o levaria de volta a casa, só saía às seis da tarde, pelo que tinha muita curiosidade a satisfazer. Sabia o mapa de cor, por isso optou por guardar a grande mochila na estação do comboio e percorrer a pé a distância que o separava do Golfo da Biscaia. Não havia cacifos na estação, viviam-se tempos conturbados por via da actividade da organização separatista, mas conseguiu convencer um grupo de trabalhadores a guardar os seus haveres, assegurando-se de que levava consigo tudo o que era importante. Não era muita coisa, para além dos documentos e algum dinheiro.

Chegou à praia e não resistiu a entrar na água, com o improviso da roupa interior a servir de calção de banho, ninguém o conhecia e estava demasiado cansado e mais ainda interessado em não perder a oportunidade para se importar com o que quer que alguém pudesse pensar. Saiu e deitou-se na areia, a aproveitar o sol outonal, sol que tinha trocado durante o Verão pelos campos de uma terreola inglesa.

Quando se levantou deu conta que o cabelo castanho claro estava ainda mais alourado pelo sal do mar, além de indomável e espetado. Voltou a não se importar e entrou numa loja à procura de alguma coisa que servisse de almoço, pouco mais do que leite, fruta e umas bolachas pois nunca tinha apetite quando o tempo era pouco para a exploração de lugares onde nunca estivera, sendo alvo do olhar apreensivo da senhora da caixa. Pagou e saiu, convencido de ter sido tomado por separatista. Só muitos anos mais tarde se apercebeu de que apenas tinha sido tido por maltrapilho.

Já no comboio sentou-se a seu lado uma rapariga franzina que trabalhava por aqueles lados e ia a casa de visita à família. O seu português já estava muito misturado com castelhano, apesar do pouco tempo que dizia ter passado desde a saída de Portugal. A carruagem era daquelas com corredor lateral e compartimentos de dois bancos corridos transversais ao deslocamento do comboio, com porta deslizante para isolamento. Foi enchendo e esvaziando ao ritmo das estações, até que em Burgos saíram os militares espanhóis entrados algumas paragens antes e ficaram ambos sós a caminho de Portugal. Tinha já anoitecido e a temperatura caíra, tornando as roupas de Verão insuficientes para se sentirem confortáveis. Decidiram deitar-se ao comprido nos bancos, um em cada um deles, para dormir até ao destino. Ele tinha o saco-cama com que passara as últimas semanas, ela apenas a roupa que trazia. Levantou-se e ofereceu-lho, para que dormisse mais quente. Ela prontamente recusou. Deitou-se então coberto com o agasalho e ensaiou a pergunta seguinte. Fez um esforço para que a voz não se lhe apagasse a meio e sugeriu então que o partilhassem.

Apesar de franzina, as suas formas acabaram por revelar-se anatomicamente perfeitas. O saco-cama, esse, voltou a revelar-se extremamente acolhedor e capaz de aumentar rapidamente a temperatura corporal. Ou isso, ou as quentes terras raianas.

2009/03/19

Algo nem tão diferente assim

Indesmentível a atracção pelo desconhecido. Agradou-lhe a proposta, era um local onde não se conseguia orientar, apesar da grandiosidade, da concentação de actividade. A forma como o tinha evitado, involuntariamente em parte, noutra por negação regionalista subliminar, a roçar o maníaco, tinha-o já cansado. Estava na altura, até por antecedente familiar, nunca se tinha negado ao papel de legítimo herdeiro espiritual, cuja sucessão acontecera muito antes do que sempre pensara.

Entranhada desde cedo a companhia de si próprio, com quem se dava bem, pensava até então, passou a estranhar a ausência da rotina em aceleração constante ao longo dos anos.

Satisfeita a curiosidade, começou a sentir o sabor incómodo das noites subitamente silenciosas. Mesmo que no meio da multidão.

2009/03/16

Faz-me uma proposta indecente!

Vamos tomar o pequeno-almoço a Barcelona?

2009/03/12

Pensamento eminentemente masculino

O trabalho também é uma forma de masturbação.

E quantas vezes não o é por falta de alternativa de elevada qualidade.

2009/03/04

Epílogo ainda menos surrealista

Mergulhou a cabeça debaixo da torneira. “Ou não aprendem, ou são tão sabidas que vêm cá porque sabem o que as espera”, o seu pensamento continuava a vaguear palos momentos que tinha passado. “Mal lhe passei as pernas para cima dos meus ombros, sentado na cagadeira, começou a arfar como uma louca. Meti-lhe a língua dentro e começou logo aos saltos, as costas a bater contra a parede. A ajuda do indicador foi só para que revirasse logo os olhos. Mas não ficou atrás, depois de recuperar quase que mo tragava até ao esófago! Nunca estive tão perto do famoso título do filme!”


Tinha sido o primeiro assalto. Beberam mais um whisky cada um, a inglesa fê-lo sentar-se num sofá baixo na zona mais escura e sentou-se de perna abertas no colo dele, frente-a-frente. Agarrou-lhe na mão e saíram para o carro dele, enquanto Julia lançava a mão à ruiva, depois de um olhar desesperado desta para não ficar só. A banheira que usava como transporte de trabalho era ideal para brincadeiras no banco de trás, para onde entraram os três. Percebendo a intenção, Carlos testou as mamas de Allison enquanto voltava a sentir Julia completamente encharcada. “Come on, put this on”, disse-lhe, estendendo-lhe o latex. Era já Allison quem o ajudava a baixar as calças e, com perícia, estendia o preservativo, não sem antes avaliar com a língua a textura do que ajudara a libertar do aperto desconfortável. Julia não estava disposta a perder a iniciativa e saltou para cima dele, afundando-se com avidez e mexendo-se descontroladamente. Carlos lambia os mamilos que a ruiva lhe oferecia e recebeu-a assim que a morena lhe libertou o espaço. Excitada pelos suspiros de Julia, não tardou que se contorcesse por sua vez, mesmo a tempo de se recomporem para a interpelação previsível com os uniformes que saiam do carro de luzes azuis, que certamente os observava ao longe. Carlos não estava em condições de conduzir, pelo que agarrou no telefone e chamou um táxi. Foram para o hotel onde se hospedavam as estrangeiras, local de onde saiu passadas duas horas, exausto, com mais meia garrafa de água das pedras da Escócia no estômago e de novo conduzido para o seu hotel.


Na manhã seguinte, dois cafés e um banho de água tépida depois de acordar, utilizou com sucesso toda a sua capacidade de impressionar com recurso a dados técnicos de projectos passados, camuflando o pouco conhecimento do projecto que apresentava.


“Tenho que me deixar desta merda”, pensava a caminho de Albufeira.

2009/03/03

Levemente surreal (II)

Foda-se lá as gajas no Algarve, não sabem outra, disse para si. E acrescentou para dentro do balcão: “I'll have the same as the lady. She's the expert”. Nesse instante, com voz melodiosa e serena, ela corrigiu o pedido: “On second thoughts, I'd rather have a screw driver”. Carlos sorriu e deu um passo em frente, afinal estava em trabalho e quanto mais depressa levasse uma nega mais tempo tinha para descansar para o dia seguinte. “If you tell me your name I'll drive us into a pleasent music place”. “We can find a professional driver, thank you very much”. Ele não desarmou, “So let's drink to professional drivers”, disse, erguendo o copo acabado de chegar. A morena sorriu e respondeu “I'm Julia”.


Acabou por enfiar ambas no carro e levá-las para uma discoteca com zonas interiores e ao ar livre. Enquanto dançava com ambas deu-se uma situação em que a morena se virou de costas, aproveitando ele para lhe segurar, ao ritmo da música, de mãos bem abertas, a zona firme das ancas. Era a reacção que ela esperava, confirmada pela mãos que lhe rodearam o pescoço e a nuca, enquanto premia com mais força o seu rabo contra o baixo ventre dele. Ele respondeu com o instinto, já tinha bebido o suficiente para se libertar do frio natural, mas não tanto que não lhe permitisse gozar toda a intensidade do momento. As mãos subiram naturalmente das ancas em direcção às mamas da inglesa, fez um ligeiro compasso de espera para perceber a reacção dela e, em resposta ao intesificar da roçadela, apalpou-lhe os montes firmes e já enrijecidos. Ela voltou-se e apertou-lhe o fundo das calças, enquanto afundava a língua dentro da boca de Carlos. Ele respondeu com as mãos por baixo da saia curta, e ela fez-lhe uma proposta irrecusável: “Meet me in the girl's loo”.


Deu o tempo que achou necessário para que chegasse a vez dela naqueles locais sempre tão concorridos, respirou fundo e irrompeu pela casa-de-banho das senhoras dentro. O gritinho solto por uma rapariga loura platinada com ar de mosca mal-morta fez com que Julia percebesse que tinha chegado e foi o sinal para lhe abrir a porta. Mal se fechou, desabou sobre ele enfiando-lhe uma mão dentro das calças e a outra entre os cabelos. Ele começou a falar-lhe em português, traduzindo, à sua maneira, para inglês: ” Eu sabia o que tu querias, minha putinha empertigada. Do you like the portuguese, love? Eu vou comer-te como tu mereces, vais fazer coro com a música. Do you want to scream louder than the quire, princess?” Ela não se deixava intimidar. “As if you could do it!”.

2009/02/26

Levemente surreal (I)

Olhou para o relógio. Eram cinco e meia da manhã. Tinha conseguido marcar a reunião para as 11, mas estava todo fodido e não sabia como havia de recuperar a tempo para a apresentação. E ainda tinha que apanhar o taxi de novo, para ir buscar o carro ao centro de Albufeira. Foda-se, quem é que tinha marcado o filho da puta do hotel em Faro, se a animação está toda em Albufeira. Mesmo sabendo que o cliente é de Faro.


Nunca mais páro com esta merda, pensava, enquanto entrava no quarto, porque é que o caralho das gajas se metem sempre à minha frente. E estão umas descaradonas que não se aguenta. Esta tinha a mania das casas de banho públicas. Mas que par de pernas até ao infinito.


Ouviu a amiga ruiva a rir-se à gargalhada e não conteve a curiosidade, voltando a cabeça para a mesa ocupada três filas ao lado. Eram duas mulheres ainda jovens, mas com ar de quem conhece os melhores segredos da vida. A ruiva devolveu-lhe o olhar, com um sorriso de convite a noite com companhia. Sempre fugiu de mulheres com cara de disponíveis, pelo que olhou para a morena em frente à atiradiça. Tinha cabelo liso comprido, negro, ombros largos, peito pouco desenvolvido para a estatura, mas com volume que se adivinhava suficiente para as suas mãos, que nem são pequenas. E umas pernas longas saídas de uma saia que, na posição sentada em que estava, lhe tapavam apenas metade do comprimento femural.


Desviou propositadamente o olhar para a sósia da Marylin Monroe que entrava no restaurante atrás de um homem moreno de fato branco com ar de empresário da noite e olhou rapidamente de lado ainda a tempo de perceber que a morena estava interessada no seu gesto. Ele percebeu que elas falavam inglês. No final da refeição dirigiu-se ao balcão para tomar café, não sem lançar um sorriso à ruiva para que ela lhe seguisse os passos. Aquele recanto do restaurante lembrava vagamente um pub inglês. A ruiva parou ao seu lado e hesitou na escolha, dando-lhe o tempo suficiente para a frase que já tinha ensaiado. “I suggest an old dry Port as the perfect end for a delightful meal. Please allow me the honour of offering something from my own town”. A ruiva deu mais uma gargalhada estridente, mas ele estava mais interessado no sorriso leve da amiga morena. “I'm Carlos and I'm from Porto, English say Oporto”. “I'm Allison and we are from Manchester”, respondeu a interlocutora. “Would you rather have a soft drink, Allison's friend?”, arriscou Carlos, em tom que indicava à morena qual o seu interesse. A resposta da visada não se fez esperar, sob a forma de um pedido ao barman, entretanto chegado. “Malt whisky, straight, please”. E com os olhos no empregado, acrescentou um “I like it harder”.

2008/10/14

No monte

Ainda mal reposto do longo beijo que quase lhe tirou o fôlego, esticou o braço esquerdo para o botão do rádio do carro e ligou o leitor de CD’s. De memória, apontou para aquela de que se recordava ser a ligação ao álbum que tinha em mente, enquanto deixava que ela descansasse a cabeça no seu ombro. Com a sorte dos audazes, Diana Krall começou a encher o espaço do automóvel, momento que aproveitou para encostar o nariz à base do pescoço dela e iniciar uma inspiração lenta e longa, aspirando a sua suave fragrância a frescas manhãs de Primavera. Entretanto, recolheu a mão que comandara o som melodioso no interior do automóvel, deixando-a, intencional mas discretamente, percorrer a curva do peito desenhado na blusa, como forma de avaliar o efeito visível da provocação nasal. Percebendo que a imobilidade feminina era uma forma de defesa instintiva, decidiu castigá-la ainda mais ao fazer a sua língua percorrer a curva da base do pescoço, seguindo-se agora a inspiração da sua companhia, enquanto um quase imperceptível arrepio revelava que estava pronta para regressar ao ataque.

Empurrou-o docemente contra a porta e esticou-se sobre ele provocando-lhe nova inspiração, agora potenciada pelo contacto das macias protuberâncias frontais. De novo sentiu os lábios, agora quentes e aveludados, e a língua que percorria os dele e lhe punha o sangue a ferver. As suas mãos voltaram ao interior das calças de ganga e iam iniciar as curvas descendentes, em espelho, quando um automóvel parou no lugar ao lado. Quedaram-se imóveis, com uma expressão de satisfação no sorriso, olhos nos olhos, enquanto os ocupantes saíam.

- Então, ainda queres ver a paisagem? – Perguntou, como forma de procurar um local mais sossegado.

- Nem podia perder a oportunidade de visitar tão sublime lugar – respondeu, agradada com a solução encontrada.

Conduziu lentamente, como gostava de fazer quando partia à descoberta de pequenas ruas e elementos arquitectónicos fora do habitual, tão comuns nas pequenas aldeias longe dos centros urbanos. Chegaram ao pequeno monte, donde se avistava a costa numa extensão de várias dezenas de quilómetros, num quadro de beleza acentuada pelo azul profundo do mar em contraste com o verde dos campos de cultivo. O cheiro a sal continuava a fazer-se sentir e o vento frio era uma bênção de encontro às faces rubras. Encostou o peito às costas dela, beijou-lhe novamente o pescoço, do lado do vento, que tinha afastado os cabelos para trás. As suas mãos subiram lentamente, sob o casaco de couro, ao longo das costelas, com as palmas abertas, até os indicadores encostarem à base dos seios dela.

2008/10/09

À beira-mar

Já não era cedo, contrariando os horários matinais que tanto gostava de praticar sempre que não dependia de terceiros. Mas o dia tinha-o contemplado com as condições que pretendia, prolongando-as até à hora em que parou o automóvel e recebeu o ar fresco da intensa brisa marítima. Antes de sair do carro decidiu, num impulso intuitivo, baixar o vidro do lado direito com o objectivo de provar logo ali que o dia se reservava ao deleite dos sentidos. Sentiu-a a inspirar mais demoradamente e saboreou a primeira vitória.

Tinham-se encontrado algum tempo antes, num local ainda distante. Ela não sabia para onde ia, sabia apenas que era à beira-mar e que o tempo ia parar. E mesmo essas informações tinham sido arrancadas e ferro e só disponibilizadas como forma de aguçar a imensa curiosidade feminina.

Saíram para a esplanada de madeira sobre a praia, o tempo frio mas seco, levemente ventoso, o sol liberto de qualquer farrapo branco no horizonte, o céu de um azul límpido e brilhante, o mar azul salpicado com espuma branca sobre as rochas. A maré estava vaza, intensificando o cheiro marinho e emprestando ao local a atmosfera necessária para uma longa conversa onde não havia temas definidos, vaguearia ao sabor de cada variante que fosse sendo introduzida.

Ela adivinhara os seus gostos de bota-de-elástico, por mais moda que houvesse apreciava sempre uma blusa branca, jeans justos mas pouco ousados, botas de cano alto e casaco de couro castanho. Ele estava igualmente casual, mas em estilo mais sóbrio, calça azul, camisa branca e blazer cinza escuro. Sentaram-se lado a lado, contemplando o horizonte profundo à sua frente. Pediu o segundo café do dia, no mau hábito de negociar à custa da cafeína os momentos de tensão a que se expunha. De seguida, com um sorriso dissimulado nos lábios, reforçou a encomenda com o refrigerante dos tomates que sabia ter um significado de provocação naquele contexto. Aquilo com que não contava era que a sua companhia o acompanhasse no pedido, ficando agora em posição mais favorável no campeonato do sorriso trocista.

À medida que a conversa evoluía a posição de cada um na cadeira foi-se tornando mais esticada, revelando o à-vontade crescente com que foram abordando os temas mais diversos, dos profissionais aos da economia, dos interesses lúdicos à mentalidade fechada da educação judaico-cristã. De vez em quando ele lançava uma provocação velada, às quais ela passou a responder dissimuladamente a partir do momento em que as suas pernas faziam já um ângulo inferior a 45º relativamente à horizontal.

Foi quando ele desviou a conversa para a costa magnífica que contemplavam e referiu as casas centenárias que polvilhavam a região, acrescentando o prazer que sempre acompanhava os seus passeios pela ruas estreitas e tortuosas das aldeias, mera introdução para o convite à observação da paisagem do ponto alto e pouco afastado das suas costas, na capela da Senhora da Guia. Ela assentiu, pelo que pagaram e regressaram ao carro. Entraram, o sol tinha aquecido o interior, tiraram os casacos, ela tirou os óculos de sol enquanto tentava alinhar o cabelo revolto pelo vento e deu com os olhos dele que viam o mar reflectido nos dela. Pressentindo que ela procurava o sol nos seus olhos, inclinou-se e provou-lhe os lábios frios, pouco seguro de não estar a ser precipitado. Durante o movimento de recuo viu como ela saboreou o gosto dele com um rápido humedecimento dos lábios e percebeu que o contacto não tinha tido a duração suficiente para ela formar uma opinião.