2007/09/14

Sereias

Flúem com a elegância dos golfinhos nas pistas a meu lado. Os óculos novos presenteiam-me com as suas belas formas arredondadas na nitidez do ambiente cristalino. Dos seus membros desprendem-se finíssimas bolhas de ar, que sobem num rasto de luz, qual poeira levantada por magníficas éguas montadas por esplendorosas amazonas.

Passam por mim enquanto as tento admirar, à socapa, camuflado pelo movimento cadenciado da cabeça, que se vira para elas a cada três braçadas. Um esforço suplementar para prolongar até ao limite da exaustão a corrida em paralelo, enquanto os olhos se passeiam pelas formas esguias, elegantes do movimento de impulsão.

Afastam-se, não sou um adepto de corridas curtas, o meu forte são os desempenhos de fundo, a primeira impressão é sempre muito ténue, discreta por timidez evidente. Mas chego ao fundo e viro sem parar, uma e outra vez e outra e outra, o objectivo é aumentar a distância percorrida da última vez, numa corrida contra mim próprio. Tal como em cada encontro revelo um pouco mais, estendo sem pressas a passadeira daquilo que sou.

Às vezes noto que param até que eu vire e recomeçam de forma a ganhar em velocidade o que perderam em fôlego. Outras vezes são simplesmente mais possantes e vão-me dando voltas de avanço por maior técnica e menor experiência de vida. Passam de novo por mim, desconcentrando-me nas formas que escondem sob aquele trajo de sensualidade intemporal. Não é por acaso que é insubstituível nos concursos de beleza.

No final, enquanto tomo o duche retemperador e me perpassa o pensamento tão masculino quanto improvável de que entrarão por ali e me pedirão ajuda para se livrarem da incómoda veste, fico a pensar se as minhas formas serão também tão tentadoras no mundo subaquático.

Aplauso

Para a intervenção de Laurentino Dias, sobre o caso abaixo comentado. Antecipando-se à UEFA e ao patrão do senhor em causa - esquecendo uma tímida intervenção do antecessor do secretário de estado, agora metido até ao pescoço no mundo da bola, que tomou a seu cargo um pretenso pedido de desculpas a lembrar as palmadinhas nas costas e a frase somos todos bons rapazes - fez saber que não andamos aqui a brincar aos pontapés e que quem prevarica paga pelo acto. É certo que sabe que a UEFA vai ser intransigente e que a FPF vai assobiar para o ar, ficando tudo na mesma após o castigo mas com o ar sério do estado à tona. Mas a lucidez do tempo da intervenção merece admiração.

2007/09/13

Não precisamos disto!

Mais uma cena lamentável proveniente do mundo irreal de onde nos habituamos a espremer o histérico orgulho nacional. Todo o trabalho meticulosamente e esforçadamente construído ao longo de meses e anos, em intervenções políticas em igualdade de circunstâncias com os nossos pares europeus, em contributos científicos e culturais, em demonstrações de elevados padrões tecnológicos, deitado por terra em questão de segundos por gente mal-formada e mal-educada que ganha prestígio à custa da facilidade das conquistas rápidas.

Não precisamos disto! Não precisamos do senhor orgulhoso, mal-educado e míope por teimosia que nos faz o favor de aceitar um ordenado escandaloso embora tenha recebido convites de toda a galáxia. Não precisamos da segunda escolha dos contemplados pelo toque de Midas, que não foram capazes de se impor no seu Olimpo e nem sequer trabalham no país de acolhimento. Não precisamos, sobretudo, de uma classe que se diz dirigente, onde os seus mais altos representantes continuam a pautar-se pelo obscurantismo, pela incompetência e por ligações da maior falta de transparência.

Esta gente não nos faz falta! Muito menos numa altura em que, mais uma vez, nos cabe o papel de provar inequivocamente que somos capazes de desempenhar um trabalho de investigação criminal ao nível dos famosos senhores sujeitos da literatura policial de referência.

Quantos de nós trabalham no anonimato para demonstrar, sem que nada nos seja pedido, que há muita gente neste país muito melhor formada do que outros que vivem nos países dos Gês e afins. No fundo, para demonstrar que somos um país normal, com gente que faz recolha selectiva de lixo e outra que não o faz.

Precisamos, sim, de todos os imigrantes que nos ajudem a progredir como povo, assim como muitos de nós ajudaram outros. Do que não precisamos é de imigrantes que se sirvam de nós e se estejam borrifando para os seus actos. Nem de um bando de fantoches incapazes de reagir à má educação.

P.S. Tentar negar aquilo que está à vista de toda a gente é feio. Além de que é mentir.