2008/07/08

Novas oportunidades

Quando a Maria Árvore falou em segunda oportunidade a propósito da mensagem anterior eu rejeitei instantaneamente a expressão, sem meditar a sério no assunto. Mas fiquei a pensar nisso e agora já posso dizer que, na minha opinião, uma segunda oportunidade é destinada a quem falhou na primeira. Acontece que na situação em causa, que não vivi na primeira pessoa, e só tenho que agradecer à providência, seja ela qual for, por isso, e, portanto, não me garante o melhor ponto de vista para escrever estas linhas, mas à qual assisti com alguma proximidade, não me atrevo a dizer que o príncipe falhou. Ele não cometeu qualquer outra falha que não fosse ter confiado que tinha escolhido a pessoa certa.

Nesta base de raciocínio, que até antevejo limitada pelo pensamento masculino pelo menos no julgamento que as atentas leitoras destas linhas certamente lhes farão, não há razão nenhuma para que a personagem principal altere a sua conduta numa relação futura. Isto a menos da redobrada dose de cepticismo que tradicionalmente passa a rodear a forma como encaram cada uma das novas amizades que fazem. Sendo assim, mais não se trata do que a repetição de todos os passos, agora com alguém ao lado desejavelmente mais empenhada e decidida.

Tenho para mim que continua a haver uma quantidade significativa de pessoas que acreditam no casamento como opção de vida. Fundamentalmente, e agora já falo em nome pessoal, por duas razões: porque a família constitui ainda uma escolha para o sentido da vida e porque a associação entre duas pessoas potencia a intensidade de sentimentos e o apuro dos sentidos. Muitos factores externos influenciam a relação, sendo o sucesso profissional um dos mais importantes, não permitindo muitas vezes a chegada ao patamar da aceitação mútua da personalidade do outro.

Sem querer já aqui levantei assuntos com pano para mangas, a ver se tenho fôlego para mais.

2008/07/03

O sapo

Tinha sido feliz durante os longos anos de namoro com a mulher com quem casou. Até faziam um par bizarro, quer em termos físicos, onde ressaltavam diferenças claramente contrárias ao estereótipo social, quer em termos de interesses pelo que a vida oferece. Mas nada parecia abalar os sentimentos que os uniam.

Até que um dia, pouco tempo depois do casamento, apareceu um emprego exigente, que obrigava a reuniões constantes do grupo de trabalho ao sábado e a centenas de quilómetros de distância. Então ele intensificou as idas ao cinema com os amigos, até que ela teve a honestidade de sair de casa e deixar perceber que, afinal, as reuniões semanais nada tinham de laboral.

Foi um choque tremendo para quem não tinha a menor dúvida sobre o passo importante que tinha dado há não muito tempo atrás, levando-o a questionar-se sobre a sua própria personalidade. Os tempos seguintes foram clássicos, o mergulhar no trabalho como fuga e o fechar da concha ao exterior, sobretudo ao universo feminino, como gesto protector. Mesmo as tentativas mais ou menos dissimuladas dos amigos próximos, a quem se entregou nos momentos de alívio, para lhe abrirem novas janelas sob a forma de jantares organizados a qualquer pretexto onde eram convidadas amigas criteriosamente escolhidas, se revelaram infrutíferas.

Passaram-se anos, até que um belo dia, passe a expressão oriunda dos clássicos contos infantis, num dos encontros, quando já estava esgotado o leque de raparigas elegíveis, apareceu acompanhado. Em público, mesmo entre amigos, o distanciamento era evidente, mas era clara a convergência de interesses e a empatia entre ambos.

Anos volvidos, o relacionamento é forte embora ainda surpreenda pela forma fria dos gestos mas reconfortantemente calorosa nas palavras. Não houve arremedos de paixão visíveis do exterior, mas cresceu aos poucos uma união muito forte em cada atitude e em cada troca de olhares.

Porque não há metades de nós perdidas algures por este mundo, mas entre a multidão há uma fracção de almas que nos entendem sem necessidade de legendas. Assim haja vontade para procurar uma delas.